Teresina - PI
janeiro 2, 2025 14:59

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Esquerda Desconfigurada: eleições 2024, PT, derrotas e perda de espaços desde 2013

Bem, quem escreve aqui é de Esquerda. Talvez vocês me concedam alguma “passabilidade” para falar, né, de como a Esquerda brasileira tá perdida, no meu ponto de vista, pelo menos desde 2013, quando não soube lidar com os movimentos que tomaram as ruas há pelo menos 11 anos atrás, deixando vácuos de poder para que novos expoentes surgissem, crescessem e os ocupassem, como foi o caso do MBL, por exemplo.

Enfim, quem escreve aqui não vai falar, nem culpar ou atrelar as derrotas da Esquerda/PT ao Identitarismo, aos Evangélicos, à Comunicação. Também não vou falar “a esquerda precisa”, “a esquerda se afastou”, “a esquerda tem que”, porque, meus amigos, a Esquerda é muita coisa de tão fragmentada e desconfigurada. E esse talvez já seja um ponto.

Mas, aos fatos. Há uma desconfiguração da Esquerda, seguida de um distanciamento e inércia da militância, por falta da compreensão e falta de comando quanto e em razão a (d)essa desconfiguração. Com 3 exemplos reais de 2024, vou tentar explicar o que estou chamando de Teoria da Esquerda Brasileira Desconfigurada.

Vamos pegar um busão para o município de Codó, localizado a 307 quilômetros da capital do Maranhão, São Luís.

MARANHÃO

Codó é a sétima cidade mais populosa do Maranhão. Cercada de quilombos, terreiros, outros. Durante o período eleitoral viajei até lá para realizar um trabalho e o que vou relatar a partir de agora é o que ouvi da boca de professores, quilombolas, artistas, religiosos, estudantes, entre outros segmentos.

O candidato a prefeito pelo Partido dos Trabalhadores foi Chiquinho FC, empresário e dono do Grupo FC Oliveira e das maiores empresas da cidade, na hotelaria, mercados, produtos de limpeza, produtos alimentícios etc.

“Pra nós, ele é o pior candidato. Quando vamos receber visitas aqui, nunca indicamos os hotéis dele para ninguém se hospedar, ele manda invadir os terrenos da nossa gente, manda bater, manda cercar [a nossa terra], então pra gente o melhor candidato era o antigo prefeito, que corre o risco de não poder disputar devido a algum problema na Justiça; se ele não puder, melhor que o Chiquinho é o prefeito atual, ou seja, o menos pior”.

Contextualizando a fala de uma líder quilombola que atua no Maranhão há mais de 30 anos. O atual prefeito com o qual o movimento ainda poderia dialogar era Dr. Zé Francisco (PSDB), que perdeu a eleição para Chiquinho FC, mesmo tendo a máquina na mão. E o candidato que teve problema na Justiça possivelmente é Guilherme Oliveira (PODEMOS) ou Biné Figueiredo.

Empresário Chiquinho FC, com dinheiro próprio e estrutura do PT venceu em Codó

“Se esse homem (Chiquinho) ganhar, como é que a gente vai defender o Lula depois, como é que a gente vai explicar pro povo mais na frente?”, me questionou a liderança.

As falas foram ditas antes da eleição. Em outras palavras, o que está dito aí é que a população, a base política, o trabalhador, a militância não se identifica com o empresário eleito, mesmo ele estando no PT, em razão de suas práticas, violentas, agressivas, e o percebe como alguém que não dialoga com a ideologia da Esquerda/PT, uma vez que ataca as minorias.

A pergunta que fica é: como que o PT então aceita candidato com este tipo de perfil? Que gera distanciamento, que causa estranhamento com o próprio partido e com aqueles que “estiveram nas trincheiras” desde sempre em defesa da sigla.

E quando você sabe que o PT destinou a ele R$ 226 mil para serem gastos com a campanha lá em Codó, mesmo ele já sendo milionário, recebendo essa quantia que poderia impulsionar diversas outras candidaturas populares, é o que a coisa fica no mínimo, “desconfigurada”, para não dizer “revoltante”.

“Peguei um trem, em Teresina, a São Luís do Maranhão”

PIAUÍ

Alguém poderia citar o governador Rafael Fonteles no Piauí, que é também empresário. De fato, o é, porém no caso dele, a imagem que se sobressai é a do Matemático, do superdotado, do rapaz que se formou muito cedo, do medalhista olímpico, do secretário de Fazenda que pagava em dias a folha de servidores do Estado. Além disso, Rafael tem raiz no PT. Seu pai, é um dos grandes teóricos do PT piauiense, foi deputado federal, era quem recebia o presidente Lula em sua casa quando das viagens e visitas de Lula ao Estado. Ou seja, Rafael, cresceu dentro da efervescência da formação e fortalecimento do Partido dos Trabalhadores no país. Embora seja uma geração mais nova dentro do partido e muita gente aponte para ele também um distanciamento perante as bandeiras do partido.

E, para permanecer ainda no Nordeste. Vamos olhar o case Fábio Novo. Petista que disputou a capital do Piauí, Teresina, e perdeu para o candidato do União Brasil, Silvio Mendes. Boa parte da campanha de Fábio foi pautada na disputa pelo espólio político de Firmino Filho, tucano do PSDB, que faleceu em 2021. Firmino comandou Teresina por quatro mandatos. Construiu uma aprovação e uma ligação muito forte no imaginário do teresinense, seja pelas suas políticas públicas e premiações nacionais, como área da Educação, seja pela própria oposição ferrenha ao PT. Então como que o candidato petista entra numa disputa pelo espólio político dele?

Não bastasse isso, Fábio foi além ao dizer que se fosse preciso, dialogaria com bolsonaristas e, de fato, seu candidato a vice, Dr. Paulo Márcio, era um bolsonarista de carteirinha. A fala de Fábio em entrevista lhe trouxe o meme “fabionaro”, bastante utilizado nas redes sociais contra ele próprio. VEJA ABAIXO:

Assim, Fábio desconfigurou a imagem da Esquerda na capital, buscando uma frente ampla em que trouxe para seu barco político, antigos aliados de Firmino Filho, desde ex-secretários a ex-deputados do PSDB, incluindo também a ex-esposa do finado, Lucy Soares e uma de suas filhas, Bárbara Soares, que atualmente é deputada estadual na base do governo petista, mas que foi eleita ainda com a força do pai psdbista.

A galera não entendeu nada. Bugou geral. Ainda mais quando do meio pro final da campanha, a filha mais nova de Firmino, Cristina Soares, entrou em cena contra a mãe e a irmã, as acusando de trair o legado de Firmino. Ou seja, sentimentalizou a campanha num nível muito alto e Fábio perdeu por mais de 40 mil votos de diferença, apesar de ter tido a maior votação em toda a história do PT na capital e embora o partido tenha saído com uma das maiores bancadas para a Câmara Municipal este ano.

MATO GROSSO

Lúdio Cabral (PT) chegou a ir para o segundo turno em Cuiabá, mas perdeu

Em Cuiabá, capital de Mato Grosso, o candidato a prefeito do PT foi Lúdio Cabral, petista com 28 anos de partido. Mas que tentou anular as bandeiras da esquerda e defendeu abertamente todas as principais pautas da direita bolsonarista, como neste programa eleitoral onde ele desconfigurou a Esquerda perante o eleitorado:

“Eu sou contra o aborto, sou contra a liberação de drogas e jamais irei implantar em nenhuma escola, nada relacionado a ideologia de gênero. Minha criação em uma família cristã, o meu juramento de proteger a vida como médico e a minha vida como pai e esposo provam o que eu digo”

No caso do Lúdio, onde Cuiabá deu a quarta maior votação proporcional ao Bolsonaro em 2022, a situação era mesmo extremamente ruim pra ele. Aí ele teve de jogar com as armas que tinha kkkk e deu mais ruim ainda. Perdeu. E se perdeu. Ser petista, ir atrás do voto do antipetista com discurso antipetista sendo petista causa um bug nos dois lados do voto, o do petista e o do antipetista. Por pragmatismo, o antipetista manteve o voto em que em ele sentiu que o discurso era mais objetivo, claro e não camuflado, ainda que também violento e radical.

Sobrevivência e Governabilidade

A desconfiguração também vem acontecendo há mais tempo e por outros meios. Por sobrevivência política, partidos de esquerda tem aceitado candidatos, com mandatos ou não, sem qualquer identificação com as ideologias das agremiações. Em Teresina, o antigo tucano Gustavo de Carvalho elegeu-se vereador em 2020 pelo PSDB e reelegeu-se em 2024 pelo PT.

Em 2022, o PT no Piauí recebeu vários deputados de outros partidos como Nerinho e Flávio Nogueira, para evitar que eles fossem para a oposição. Eles se reelegeram no PT, o PT fez grande bancada estadual para a Assembleia Legislativa, ainda que nomes históricos do partido não tenham conseguido êxito nas urnas, desconfigurando assim pelas entranhas o próprio partido. É o preço.

Mais Pontos

O que foi exposto aqui é apenas uma ponta de inúmeras outras reflexões que podem ser feitas na conjuntura atual em novos textos futuros, desde a influência real dos influencers nas eleições, a cooptação das vendedoras de conteúdo adulto, da galera #244, as licitações, emendas e editais mal fatiados, entre muitos outros tópicos. Fantasmas como o Comunismo, Censura, Rouanet, Direitos dos Manos, Banheiro Unissex, Mamadeira de Piroca e tantos outros continuam a assombrar e ser uma pedra lançada sobre a esquerda e que a esquerda não consegue atirar de volta. Enfim.

Esta postagem não é sobre procurar culpados, apontar erros, julgamentos vãos, críticas vazias, mas reunir evidências e tentar montar algum quebra-cabeça que entregue a saída do labirinto no qual nos perdemos.

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